Oficina de teoria do romance
A oficina do dia 22 de maio, sala 130 às 18h, que será ministrada por Lindberg Campos Filho, tem a intenção de apresentar alguns resultados de uma pesquisa de doutorado sobre o Romance de Três Vinténs" (1934) de Bertolt Brecht. Em linhas gerais, pode-se dizer que este romance é uma adaptação (com consideráveis acréscimos) do texto dramático para 'A Ópera de Três Vinténs' (1928) do mesmo autor.
A hipótese interpretativa desse romance se baseia no princípio da montagem didática construída em torno do impulso de esclarecimento e de denúncia dos mecanismos visíveis e invisíveis da reprodução do capitalismo como sistema de dominação econômica e cultural. Nesse sentido, o principal ganho nessa transposição da linguagem teatral para o gênero essencialmente narrativo do romance parece estar na maior abrangência temática e capacidade explicativa dos mecanismos que o processo de acumulação capitalista enseja - tanto do ponto de vista subjetivo (processos de aburguesamento, colapso das virtudes, desolidarização social etc.) quanto do ponto de vista mais propriamente objetivo (esquemas de empreendedorismo, de financeirização, de corrupção estatal, de exploração do trabalho, prostituição, pauperização etc.). Mais: sendo todo autor obrigado a usar dispositivos retóricos, isto é, de persuasão discursiva, o diferencial do romance também se encontra no fato do romancista ter diante de si um arsenal retórico muito amplo e isto era algo que sem dúvida interessava a Brecht.
Faz-se importante notar, no entanto, que o preço da profundidade, ao menos nesse caso, é a menor portabilidade ou circulação que o romance possui em relação ao espetáculo teatral. Daí, talvez, tenha emergido a vontade do seu autor de mobilizar a mesma história para diferentes gêneros, principalmente tendo em vista que, apesar dos pesares, também exista um filme homônimo de 1931. No que se refere à estrutura geral do romance, pode-se afirmar de antemão que a onisciência da narração; a desfaçatez que marca o enredo dividido em prólogo, cenas, capítulos, livros, epílogo e interrompido por letras de canções; a ostensiva tipicidade e platitude das personagens; a ambiguidade das coordenadas sócio-históricas dentro do quadro de uma progressão temporal pautada pela ação; e o espaço que explora a coexistência entre, de um lado, o refinamento de restaurantes, casas burguesas, escritórios e, de outro lado, espeluncas como bordéis, prisões, bares e guetos na então capital do capitalismo mundial - Londres - são elementos constitutivos da narrativa articulados não apenas para dar um testemunho sobre contradições irresolvíveis no plano simbólico, mas também para retratar aspectos, a um só tempo, voláteis e permanentes de todo um modo de produção desde a sua formação até a sua maturidade nos anos 1930. Ou seja, o romance experimenta, e portanto produz, quando busca a forma de colocar em movimento a ideia de "Darstellung" (a um só tempo, apresentação e representação) através da exposição estranhada do capitalismo enquanto temporalidade sócio-histórica determinada por um processo bastante peculiar de acumulação de excedente.